quarta-feira, 18 de janeiro de 2017

O que não é mais


Abro a porta de casa, silêncio. O mundo corria lá fora. Nada estava fora do lugar, nada havia sido mexido. Nenhum sinal  humano havia passado lá. Não havia ninguém, somente nossos bichos que habitam aqueles espaços... Sigo ao quarto pra me despir da rua e ficar comigo mesma por alguns instantes... A porta do outro quarto, frente à minha, estava aberta. E lá estava ele, com seu corpo nu, descansando sobre o que um dia foi nossa cama, despreocupado, sem culpa e em paz das turbulências da vida. Parecia celestial. Fiquei parada à porta, admirando tamanho desprendimento e entrega aos sonhos... Ressonava, até! Não me ative em ficar muito tempo, pois havia o medo de ser interpelada pelo seu olhar que provavelmente seria de reprovação quando acordasse. O silêncio na casa, o mundo correndo lá fora. Por alguns segundos saí do meu corpo e me vi ao lado dele, passando a mão naquelas pernas que tanto me envolveram com sua força e vigor. Voltei a mim. Saí de frente daquela porta sem fôlego. Sempre perdi o fôlego no seu corpo. Seu largos quartos, peludos e desajeitados sempre me encantava. Ainda encanta. Voltei no tempo! Voltei ao tempo onde tudo aquilo me pertencia, cada curva, cada pelo. Foi um dia desse que tudo isso se acabou. Simplismente acabou! Ainda sinto seu cheiro em meus lençóis. Ah, seu cheiro... Volto à porta do quarto e ele continua lá, largado e lindo! Meu coração dispara e se aperta. Dói. Aquele corpo não me pertencia mais. Aquele corpo agora pertence à outra. Volto a cuidar de mim nos outros cômodos da casa, mas com o pensamento naquele quarto. Tenho que voltar a vida! E voltei ao mundo. Fiquei o resto do dia com saudades, admirada e triste.

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